domingo, 10 de novembro de 2013

Do direito à desconexão ao dano existencial no teletrabalho. O excesso de horas extras destinadas ao trabalho.


Para a elaboração deste texto tomei por base o trabalho do advogado, em especial neste atual cenário de mudança de paradigmas, qual seja, o momento de implantação do processo eletrônico. 
A implementação, em larga escala, do Processo Judicial Eletrônico no ano de 2013, trouxe uma série de questionamentos e quebras de paradigmas em relação ao trabalhador que deverá, obrigatoriamente, se adaptar ao sistema.
O CNJ, instituidor do projeto, "vendeu" aos advogados, ao judiciário e a todos aqueles instrumentalizadores do processo, como um benefício, um avanço ou algo que iria facilitar a vida de todos, e inclusive, (motivo que achei mais plausível) irá diminuir a circulação de papel e será mais ecologicamente correto.
Pois bem, essa propaganda para a “venda” do processo eletrônico deve ser analisada sobre alguns parâmetros específicos, nos âmbitos social, psicológico e da saúde do próprio trabalhador e de sua família, que passo a abordar a seguir.
Primeiramente, abordo a relação do processo eletrônico posta de encontro a limitação da jornada de trabalho. A propaganda do CNJ inclui o benefício de se peticionar e consultar o processo a qualquer hora e local, bastando para isso acesso a internet, assinatura digital, e alguns softwares cedidos de forma gratuita.
Diante deste cenário, já podemos enxergar advogados trabalhando após às 18h, de madrugada, em finais de semana, enfim, em “qualquer hora e em qualquer lugar”.
Ocorre que, quando se analisa o profissional autônomo, chega-se a conclusão de que este poderá administrar mais o seu tempo, os seus prazos e terá mais liberdade para fazer o que bem entender do seu tempo de sobra. Ledo engano, o profissional autônomo, apesar de ter seu custo reduzido com cópias e impressões, irá trabalhar cada vez mais, pois além de ter que ficar em horário comercial a disposição dos clientes, ainda poderá, e irá fazer, protocolos em dias e horários que antes não eram permitidos. Ou seja, antes as 18h não havia mais nada a ser feito, pois não poderia mais se protocolar nada e o expediente do escritório já tinha terminado. Com a nova tecnologia, cada vez irá se trabalhar mais para se ganhar a mesma quantidade de dinheiro para ter uma “vida digna”.
Agora, pense no advogado que é contratado de um escritório de advocacia, que eu estimo sejam em torno de 70% dos advogados do país, o advogado que antes tinha que terminar todos os seus prazos fatais (do dia) até as 15 horas, para que algum estagiário, ou advogado mesmo, pudesse levar as petições para serem protocoladas nas varas ou tribunais, agora pode trabalhar tranquilamente até às 23h59min59seg, pois é esse o limite para se protocolizar um prazo do dia, ou seja, será que esse advogado “empregado” teve uma vantagem com a implementação do PJe? Ou será que por ter mais tempo para ser feito o protocolo ele poderá produzir mais, já que o protocolo não fecha mais? Essa é a dúvida que tenho, iremos trabalhar menos ou mais?

E a jornada de trabalho, como fica? A ideia de flexibilização da jornada ainda causa certo furor na justiça do trabalho, pois, acredita-se que o trabalhador será ferido no seu direito à desconexão, direito este que já é bastante discutido entre os doutrinadores e já vem ganhando espaço no judiciário trabalhista.
A ideia de desconexão é a mesma de tempos passados, tentar "libertar" os trabalhadores pra que possam desligar-se de suas atividades laborais, e ter direito ao ócio[1], ao lazer e, por consequência, à saúde mental.
A linha de pensamento segue no sentido de que a atividade laboral não pode retirar a essencialidade do trabalhador, que é de ser um ser humano social, para se tornar, apenas, uma força de trabalho ou uma máquina humana que não precisa de descanso, nem lazer.
 A nossa Constituição Federal, conhecida como cidadã, assegurou vários direitos sociais aos brasileiros, como o direito ao lazer e à saúde, e são exatamente estes direitos que podem ser violados com a conexão integral às atividades laborais, sem qualquer controle de jornada, ou limitação na desta.

Antigamente, nos primórdios do direito do trabalho, não havia legalmente a estipulação da jornada máxima de trabalho, os empregados trabalhavam em fábricas ou fazendas sob os olhos de seus empregadores, totalmente subordinados. Ao final do dia, porém, iam para casa e desfrutavam de suas famílias, bem como da vizinhança e amigos, enfim, possuíam uma vida social regrada, apesar da ausência de proteção legal.
Com a implantação efetiva do capitalismo e da industrialização das grandes cidades, as jornadas de trabalho foram ficando cada vez mais extensas, tornando a vida do trabalhador totalmente ligada ao seu trabalho, se adoecia, era descartado e colocada outra “peça” em seu lugar[2].
Ocorreu, naquela época, que com as extensas jornadas, os empresários começaram a se dar conta que não tinham mais consumidores, ou seja, os trabalhadores eram os próprios consumidores dos produtos que produziam, se eles estavam produzindo muito tempo, não teriam tempo para consumir. Essa constatação, somada à indignação dos trabalhadores, fez com que os empresários diminuíssem o tempo de trabalho para que o sistema capitalista pudesse funcionar. Sem consumidores, não há porque produzir tanto.
 Atualmente estamos vivendo um sistema parecido, nas suas devidas proporções, ao que já ocorreu no passado, pois “... a história é cíclica, e tudo o que aconteceu acontecerá outra vez, até ao mais pequeno pormenor.”[3] como diria Nietzsche em sua teoria do Eterno Retorno[4].

Os meio telemáticos aplicados às relações de trabalho podem trazer uma série de benefícios para as pessoas que as usam: como encurtamento de distância, eficiência em relação ao tempo das tarefas a serem executadas, alto fluxo e troca de dados, respostas imediatas a dúvidas e a procedimentos (que antigamente levavam um tempo razoável para serem resolvidas). Podemos citar como exemplo dessa revolução, o envio de cartas e a longa espera pela resposta das mesmas.
O problema principal é que esse aceleramento de procedimentos acarreta, ao ser humano, uma série de obrigações que antes não existiam, como por exemplo, ter que responder imediatamente um e-mail ao ser recebido, pois a pessoa “do outro lado” da conexão está esperando a resposta ansiosamente.
É atividade corriqueira em escritórios de advocacia, e talvez em outra série de escritórios não-jurídicos, o envio e o recebimento de inúmeras mensagens eletrônicas. Seguidamente ocorre das mensagens eletrônicas “e-mails” não serem respondidos de imediato, e o emissor da mensagem eletrônica ligar, através de um aparelho telefônico, para a pessoa destinatária pra avisar ou cobrar que enviou a mensagem e que a mesma ainda não foi respondida.
Essa ansiedade pela informação e o fácil acesso de conteúdo disponível na rede mundial, remete a um problema que cada vez se verifica mais comum, o excesso de conexão com o trabalho. Responder mensagem de trabalho em finais de semana, após a jornada “física”, levar trabalho para casa, enviar prazos em períodos que se não houvesse a tecnologia não poderiam ser mandados, enfim, uma série de meio que são oferecidos como benefícios. Assim, fica a pergunta: A tecnologia está a nosso favor, ou contra nós?
 Exemplo recente desta desconexão, foi de uma notícia veiculada no sitio eletrônico do Tribunal Regional do Trabalho da 4ª região, (já comentada no post anterior) a mesma foi divulgada como se fosse um avanço na implementação do PJe. A notícia tratava do ajuizamento da primeira inicial no processo eletrônico à 0h05min do dia 23/09/2013 na Vara do Trabalho de Porto Alegre[5].
Diante desta notícia surge a pergunta: Como não é possível o jus postulandi (ingressar com a ação sem advogado) no processo eletrônico, certamente um advogado estaria trabalhando a essa hora para enviar uma petição inicial, caso não tivesse essa possiblidade de envio após às 18h, se não existisse o tão eficiente e polêmico PJe, o que estaria fazendo esse trabalhador?
A ideia é que, como o advento do processo eletrônico, não haverá mais jornada de trabalho fixa, e em breve não haverá mais “horário comercial” tendo em vista as diversas tecnologias que estão sendo inventadas pelo capitalismo voraz.
Precisamos consumir claro, como faremos? Tudo pela internet! E os amigos, os relacionamentos, como ficarão? Redes sociais! Webcans! Parece exagero pensarmos assim, mas não estamos muito longe das relações, tanto trabalhistas como sociais, puramente digitais.
Esse excesso de tecnologia e de afastamento entre os seres humanos faz com que cada vez, trabalhemos mais intelectualmente e menos fisicamente, podendo acarretar problemas “não visíveis” de saúde.
Antigamente era fácil verificar quando o trabalhador estava com alguma doença relacionada ao trabalho, bastava um exame clínico, uma radiografia, e lá estava a lesão física, (coluna, tendões, músculos...) mas e agora? Com o trabalho manual sendo substituído pelo intelectual, como saber se a ineficiência está ligada ao trabalho pura e simplesmente ou se é por outro motivo? Verifica-se que o problema é muito mais difícil de ser diagnosticado, pois está relacionado à mente humana.
Dados da OMS informam que a depressão, em 2030, será a doença mais comum do mundo.[6], ultrapassando casos de câncer e de doenças cardíacas. 
Se o trabalhador está em casa, longe dos tradicionais modelos fordistas industriais, como irá o empregador, ou algum órgão de fiscalização, verificar se o empregado está sofrendo de alguma doença? Como o trabalhador irá “faltar” ou não se conectar ao trabalho algum dia? Poderá estar trabalhando em horário noturno, doente, em ambiente insalubre, em jornadas dilatadas, e não se poderá verificar essas condições, simplesmente por não saber onde esse trabalhador está.
Com o desmembramento dos escritórios ou das empresas (modelo toyotista) ou de uma jornada mista (jornada normal no estabelecimento físico e outra jornada em casa, ou onde estiver conectado) a tendência é de que o empregado/trabalhador irá ter a sua jornada de trabalho dilatada, ou seja, irá trabalhar mais, ficará mais tempo conectado ao trabalho, ou quiça, não terá mais jornada de trabalho, pois estará totalmente conectado ao seu empregador e a seu ofício.
Talvez somente vá se desconectar ao gozar férias, isso se não ficar conectado a internet ou possuir um Smartphone dotado de todas as tecnologias que não o deixarão “desinformado”. A possibilidade de este trabalhador receber todas as formas possíveis da informação e dos meios de comunicação da era moderna, não o deixará desconectado.
Atualmente, na doutrina mais moderna, muito se tem falado sobre o direito fundamental a desconexão, que nada mais é do que um direito constitucional à saúde (física e mental) e ao lazer, sendo totalmente interligada a limitação efetiva da jornada de trabalho.[7]
Jorge Luiz Souto Maior [7], em sua obra, entende que a não limitação de jornada é inconstitucional e cita o caso do artigo 62, I da CLT, como o principal vilão.
Nesse sentido, inclusive, houve aprovação do Enunciado 17 da 1ª Jornada de Direito Material e Processual na Justiça do Trabalho, com o seguinte teor:

17. LIMITAÇÃO DA JORNADA. REPOUSO SEMANAL REMUNERADO. DIREITO CONSTITUCIONALMENTE ASSEGURADO A TODOS OS TRABALHADORES. INCONSTITUCIONALIDADE DO ART. 62 DA CLT. A proteção jurídica ao limite da jornada de trabalho, consagrada nos incisos XIII e XV do art. 7o da Constituição da República, confere, respectivamente, a todos os trabalhadores, indistintamente, os direitos ao repouso semanal remunerado e à limitação da jornada de trabalho, tendo-se por inconstitucional o art. 62 da CLT.

Verifica-se que o teor do enunciado é bem claro ao afirmar a proteção jurídica ao limite da jornada de trabalho, não podendo existir norma que não obedeça esta regra.
Esta limitação não é uma invenção, ela tem amparo em estudos e lutas dos trabalhadores pelos três “oitos” (oito horas de trabalho, oito horas de ócio/lazer e oito horas de descanso/sono).
Em relação ao trabalho a distância citado, principalmente em relação ao processo eletrônico “24 horas”, essa limitação se torna “flexibilizada”, ou seja, o trabalhador, em tese, não pode escolher onde irá executar suas atividades, ele simplesmente obedecerá às ordens de seu empregador. Para este é muito mais vantajoso que o seu empregado permaneça fora de um ambiente tradicional de trabalho, pois poderá trabalhar além da jornada mínima e não precisará remunera-lo por isto, pois estará amparado pelo citado artigo 62, I da CLT.
Essa situação é muito bem colocada em um Artigo chamado "Horas Extras em Trabalho Externo" escrito pelo Juiz do Trabalho da 4ª Região, Carlos Alberto May[8], onde o autor menciona que se o não controle da jornada for benéfico apenas ao empregador, a sistemática está equivocada, é a chamada “omissão conveniente”, onde a empresa se beneficia do sistema, pois torna conveniente alegar que não era possível controlar o horário de trabalho do empregado, obtendo com isso, vantagem financeira em não ter a obrigação de pagar a contraprestação pelo excesso de jornada.
Essa alegada ausência total de controle de jornada é praticamente inadmissível nos dias de hoje, onde se pode localizar qualquer pessoa, por G.P.S., telefone celular, rastreadores, registros de pontos de venda, entre outros.

A ausência de controle de jornada, pela alegação de que o empregado está trabalhando fora “dos olhos do empregador”, por óbvio que irá ter como consequência o extrapolamento da jornada legal. Esse excesso de ligação com atividade laboral, está totalmente ligado ao excesso de horas trabalhadas que por si só já causa uma série de transtornos ao trabalhador, tanto em relação a evolução profissional como na vida social. Esta situação na qual o trabalhador está sendo submetido já vem sendo tema de debate na doutrina e inclusive o poder judiciário está solidário com esse panorama atual. Vejamos recente decisão do TRT da 4ª Região em relação ao tema:

DANO EXISTENCIAL. Há dano existencial quando a prática de jornada exaustiva por longo período impõe ao empregado um novo e prejudicial estilo de vida, com privação de direitos de personalidade, como o direito ao lazer, à instrução, à convivência familiar. Prática reiterada da reclamada em relação aos seus empregados que deve ser coibida por lesão ao princípio constitucional da dignidade da pessoa humana (art. 1º, III, da Constituição Federal). Data: 18/04/2013 Redator: RAUL ZORATTO SANVICENTE processo 0001133-16.2011.5.04.0015. in www.trt4.jus.br

O dano existencial no Direito do Trabalho, também chamado de dano à existência do trabalhador, decorre da conduta patronal que impossibilita o empregado de se relacionar e de conviver em sociedade por meio de atividades recreativas, afetivas, espirituais, culturais, esportivas, sociais e de descanso, que lhe trarão bem-estar físico e psíquico e, por consequência, felicidade; ou que o impede de executar, de prosseguir ou mesmo de recomeçar os seus projetos de vida, que serão, por sua vez, responsáveis pelo seu crescimento ou realização profissional, social e pessoal.
Essas lesões comprometem a liberdade de escolha e frustam o prejeto de vida que a pessoa elaborou pra a sua realização como ser humano. Julio César Bebber[9] optou por qualificar esse dano com o epíteto já transcrito justamente porque o impacto por ele gerado “provoca um vazio existencial na pessoa que perde a fonte de gratificação vital”.
A quebra de expectativas do trabalhador em relação a sua carreira, pela falta de tempo, compromete e muito o seu avanço profissional, o seu networking e a sua existência como ser humano na sociedade. A Legislação que temos está obsoleta, não há qualquer regulamentação para o que estamos prestes a vivenciar.
O trabalhador não está protegido diante dos avanços da tecnologia, a CLT, apesar de ter sofrido algumas modificações é de 1943 e a Constituição Federal, no último dia 5 de outubro completou 25 anos.
Assim, como já dito, apesar de terem sofridos alguns ajustes ao longo do tempo, as normas citadas foram formuladas quando, ainda havia muito trabalho manual e pouco intelectual, agora, passado todo esse tempo, caberá ao legislador, ou ao poder judiciário, enfrentar esses conflitos com base nas fontes possíveis de direito existentes.

Por fim, retornando ao exemplo do Processo Eletrônico e do trabalho do advogado, a ideia que está sendo vendida a estes, em especial, sobre a possibilidade de trabalho 24 horas por dia, nos sete dias da semana, parece ser totalmente infundada e está na contramão da ideia de qualidade de vida do trabalhador.
Com a mudança dos parâmetros conservadores das instituições, onde o trabalhador ficava 8 horas dentro da fábrica e na saída se desligava totalmente de seus afazeres laborais, está sendo ultrapassada pela ideia de flexibilização da jornada de trabalho. A pergunta que fica é se as tecnologias estão vindo a favor, ou contra o trabalhador? Ou seria mais uma forma de fomentar o capitalismo e fazer com que o ser humano produza mais riqueza, sem qualquer limitação? Acredita-se, infelizmente, que a segunda resposta é a mais viável.

Referências:
 [1] LAFARGE, Paul. O direito a preguiça. eBooksBrasil.com. Rocketedition. 1999.Ed. Claridade.
[2]  CHAPLIN, Charles. Filme Tempos Modernos. “Modern Times”. Kino Internation Corporation. 1930.
[3] KENNY, Anthony História Concisa da Filosofia Ocidental. 1998 Título original:A Brief History of Western Philosophy - Tradução: Desidério Murcho, Fernando Martinho, Maria José Figuei-redo, Pedro Santos e Rui Cabral. Ed. Temas & Debates.
[4] YALOM, Irvin D.. Quando Nietzsche chorou. 2009. Ed Agir.
[5] http://www.trt4.jus.br/portal/portal/trt4/comunicacao/noticia/info/NoticiaWindow?cod=779062&action=2&destaque=false&filtros=
[6]http://www.estadao.com.br/noticias/geral,oms-depressao-sera-doenca-mais-comum-do-mundo-em-2030,428526,0.htm
[7] SOUTO MAIOR, Jorge Luiz. Do Direito à Desconexão do Trabalho. Revista do Tribunal Regional do Trabalho da 15ª Região. Campinas, n.23, 2003.
Disponível em : http://trt15.gov.br/escola_da_magistratura/Rev23Art17.pdf Acessado em 01/10/2013.
Acessado em: 01/10/2013.
[9] BEBBER, Júlio César. Danos extrapatrimoniais (estético, biológico e existencial) – breves considerações. Revista LTr: legislação do trabalho, São Paulo, v. 73, n. 1, p. 26-29, jan. 2009.

sexta-feira, 27 de setembro de 2013

PJe é bom pra quem?

    Apesar de já ter uma série de varas que já adotavam o Processo Judicial eletrônico no país, nesta segunda-feira (23) o mesmo foi implantado aqui no Judiciário Trabalhista da capital gaúcha. Na notícia da inauguração do PJe postado no site no TRT da 4ª região, teve um fato que me chamou bastante a atenção. A primeira reclamatória foi ajuizada à 0h5min (meia noite e cinco minutos), como não é possível o jus postulandi por meio do PJe, provavelmente tinha algum advogado trabalhando a essa hora. O que é apresentado como vantagem pro advogado pode ser encarado como a ausência de jornada ou ausência do direito à desconexão, vejamos a citação da notícia:


Vantagens Além de eliminar o uso do papel, o PJe-JT automatiza diversos atos processuais, proporcionando maior agilidade ao andamento dos processos nas unidades judiciárias. A expectativa, com isso, é de que os processos eletrônicos sejam julgados em menos tempo. Para os advogados, o PJe-JT também traz uma série de vantagens: menor necessidade de deslocamento à Justiça do Trabalho, peticionamento via internet 24 horas por dia, possibilidade de os procuradores das duas partes acessarem os autos ao mesmo tempo, dentre outras.

    O peticionamento via internet 7 dias por semana e 24 horas por dia é apresentado como "vantagem". Não quero ser saudosista, nem mesmo levantar a bandeira da anti-tecnologia, mas lembro da época que o advogado acabava os prazos até as 16h para que fossem protocolados no Fórum, agora, o advogado não tem mais horário para acabar o prazo, ou melhor, tem, 23h59min59seg, ou seja, poderá trabalhar mais tempo, fazer mais coisas, poderá ser mais explorado... enfim, isso é uma vantagem?

    O PJe foi imposto aos advogados, não foi vendido, os advogados não compraram essa ideia, o judiciário impôs e agora os advogados devem se adaptar a ele. Entendo que o Processo Eletrônico é uma modernidade, mas agora temos que pensar nos seres humanos que instrumentalizam o mesmo. Monitorar a que horas estão sendo feitas e protocoladas as petições enviadas ao sistema. Acredito que a maior parte dos envios ocorrerá dentro do período "comercial", mas temos que atentar para a quantidade de petições e iniciais protocolizadas fora desse horário, como foi o caso da citada "primeira" inicial ajuizada à meia noite e cinco minutos.

    Tenho minhas dúvidas se o PJe vai ser bom para os advogados. Para o judiciário e para as partes talvez seja, mas para os 800 mil advogados existentes no país tenho muitas dúvidas.

quinta-feira, 4 de julho de 2013

"Dos protestos ao movimento social" (José Pastore)

                                A eclosão dos protestos de rua me fez rever as teorias que procuram explicar a dinâmica das manifestações coletivas. Estas costumam surgir abruptamente, refletindo aspirações não atendidas, como vem ocorrendo no Brasil. Nesses episódios, o comportamento da massa pouco tem a ver com o comportamento dos indivíduos. Alguns autores dizem retoricamente que as multidões têm personalidade própria e, por serem contagiantes, atraem pessoas que dispensam análise crítica das motivações. A adesão é feita com base na imitação, sugestão e interação intensas com as próprias massas. A propagação é proporcional aos sentimentos de frustração e à percepção da inadequação das instituições que deveriam atender as expectativas e não o fazem.
                As manifestações coletivas ganham ímpeto quando se identifica um vilão — ainda que vagamente. No caso do Brasil, o governo vem sendo responsabilizado pela insatisfação popular, inicialmente pelo aumento da tarifa de ônibus e, em seguida, por várias insatisfações latentes, em especial, pelos desperdícios de recursos públicos que conspiram contra a melhoria de vida dos brasileiros. As redes sociais potencializaram o papel do vilão e fizeram o movimento ganhar foco. O governo ficou encurralado, tendo sido rotulado, a um só tempo, como culpado e sem moral para agir.
                A movimentação atual poderá ganhar mais força com a chegada do papa Francisco, que vem ao Brasil para abençoar a Jornada Mundial da Juventude. Milhões de jovens estarão concentrados em praças públicas, em situação de incontrolável contágio. Poderá surgir ali a oportunidade para homenagearem o Santo Padre — que prega a humildade, a moralidade e o respeito ao próximo — e condenarem os perdulários governantes com cartazes em vários idiomas para serem entendidos em todo o mundo via internet, movimento de dimensão planetária.
                Até o momento não surgiram líderes. É assim mesmo. Os líderes costumam emergir quando as manifestações coletivas se transformam em movimentos sociais. Ao contrário das manifestações coletivas, os movimentos sociais são estruturados, possuem objetivos claros e planos definidos para a viabilização. Nesse estágio é que surgem indivíduos que, por terem encarnado os protestos iniciais, se tornam líderes, desde que revelem possuir soluções para atender os descontentes.
                Os líderes podem ser do tipo carismático ou do tipo administrador. O líder carismático se impõe pelas qualidades que diz ter e que são aceitas pelos liderados. Tende a ser impulsivo, dramático, com ares de herói e focado na solução dos problemas imediatos. Na memória dos brasileiros, Lula ocupa posição de destaque. O líder administrador tende a ser objetivo, pragmático, propositivo, cauteloso e preocupado também com o futuro do país. Estaria aí o estilo de Fernando Henrique Cardoso.
                Para ser efetivo, o movimento social terá de mobilizar grandes massas e conquistar a confiança dos adeptos para, com isso, impulsionar as mudanças pretendidas. Tudo depende da estruturação do movimento e do sucesso inicial do plano de mudança. Se vingar, o movimento social pode modificar ou substituir as instituições vigentes e, em caso extremo, mudar o regime político do país. É que vimos no Oriente Médio nos anos recentes.
                Reitero, porém, que nem toda manifestação coletiva evolui para movimento social. Muitas manifestações perdem força ao longo do caminho. Caso recente é o movimento Occupy Wall Street, nos Estados Unidos, que se dissolveu em pouco tempo. O que se pode antever no Brasil? Estamos num ponto crítico. Os protestos das ruas pode m avançar na direção de um movimento social ou se esgotarem por desânimo, cansaço ou ação dos governantes.
                No momento, o governo está sem ação. Pode sacrificar alguns bodes expiatórios (trocar ministros) na tentativa de reconquistar a confiança do povo. Mas, aos olhos dos manifestantes, será difícil se livrar da pecha de vilão. Se prosseguir, a decepção poderá comprometer os planos de reeleição dos governantes de plantão. Dela poderão ocorrer desdobramentos voltados para reformas profundas dentro ou fora da ordem vigente.
                Disso tudo se tira importante lição. O Brasil mostrou ao mundo que uma parcela expressiva da população não se enquadra nos resultados das pesquisas de opinião pública que até outro dia classificavam os brasileiros como o povo mais feliz do mundo. A esses pesquisadores fica a recomendação para, daqui para a frente, observarem com mais acuidade os sentimentos latentes dos brasileiros.
  
José Pastore é professor de relações do trabalho da FEA-USP e membro da Academia Paulista de Letras.

Publicado em 29/06/2013 no Correio Braziliense.

terça-feira, 9 de abril de 2013

Domésticas - o que faltou dizer


9 de abril de 2013 | 2h 04
José Pastore *
Se a sua empregada doméstica precisar fazer uma hora extra, lembre-se de que ela terá de descansar 15 minutos antes de começar. Se você precisa de muitas horas extras, atente que ela não pode exceder dez horas por semana. Se dorme ou não no emprego, ela terá de ficar 11 horas sem trabalhar depois de encerrada uma jornada. Atenção: ela não pode comer em menos de uma hora em cada refeição. Se ela demorar mais de dez minutos para entrar no serviço, trocar de roupa ou tomar banho na hora da saída, esse tempo será contado como hora extra. Se ela dorme no quarto com uma criança ou um doente, terá de ser remunerada com adicional noturno e eventualmente hora extra por estar à disposição daquela pessoa. Se você tiver de compensar em outro dia as horas a mais que ela trabalhou no dia anterior (banco de horas), lembre-se de que isso tem de ser previamente negociado com o sindicato das domésticas. Se você concede à sua empregada um plano de saúde e ela se acidentar e for aposentada por invalidez, o plano terá de ser mantido pelo resto da vida. Se, para melhor controle do seu desempenho, você estabelecer metas e tarefas diárias que sua empregada considere exageradas, ela pode processá-lo por danos morais. E se você não pagar a indenização que o juiz determinar, ele penhorará (online) o saldo da sua conta bancária - sem prévio aviso.
Tudo isso está na lei e na jurisprudência. E há muito mais. Para ser franco, o espaço todo deste jornal não seria suficiente para explicar as complicações decorrentes dos 922 artigos da CLT e dos milhares de normas administrativas e orientações dos tribunais. Por isso vou parar por aqui, mesmo porque não quero ser considerado catastrofista. Nem por isso, porém, posso concordar com a opinião da nobre desembargadora Ivani Bramante, publicada neste caderno (2/4), segundo a qual os patrões estão com paranoia (sic) em relação à nova lei das domésticas.
O fato é que, no País inteiro, não se fala noutra coisa. A apreensão é geral. Os políticos já perceberam o desconforto e a irritação causados pelo impensado ato. Muitos já reformulam o seu cálculo eleitoral: se ganharam a simpatia das empregadas, perderam o apoio dos milhões de eleitores que não podem prescindir dos serviços de uma babá ou de um cuidador de idoso. A esse grupo se juntarão as empregadas que serão dispensadas.
Convenhamos, a execução do atual cipoal trabalhista já é difícil nas empresas. O que dizer das famílias, que não dispõem de contador, departamento de pessoal e assessoria jurídica? A nova lei, além de encarecer os serviços (que já estão caros), vai mudar o relacionamento entre empregada e empregador, que, de confiável e amistoso, passará a burocrático e conflituoso.
Os políticos buscam agora colocar uma tranca na porta que acabaram de arrombar. Mas as emendas poderão sair pior do que os sonetos. E podem ser inúteis, pois, a esta altura, as famílias que podem já se puseram a desenhar a sua vida sem a ajuda das empregadas domésticas.
A questão do encarecimento também é séria. O meu amigo Osmani Teixeira de Abreu, conhecedor profundo das relações do trabalho no Brasil, acredita que, em médio prazo, vai sobrar empregada doméstica, porque muitos empregadores não terão condições de cumprir a nova lei. Ele argumenta que na empresa, quando há um aumento de custo, o empresário o repassa ao preço ou o retira do lucro. O empregador doméstico não tem como fazer isso, porque geralmente é empregado e vive de salário, que não é elástico.
Ou seja, na pretensão de melhorar a vida das empregadas domésticas, nossos legisladores deixaram de lado o que é mais prioritário no momento presente, que é a formalização dos 5 milhões de brasileiras que não contam sequer com as proteções atuais. Será que aumentando os direitos e criando tanta insegurança elas vão ser protegidas? Penso que não. Muitas serão forçadas a trabalhar como diaristas, sem registro em carteira.

* José Pastore é professor de Relações do Trabalho da FEA-USP e membro da Academia Brasileira de Letras

segunda-feira, 1 de outubro de 2012

Decisão na contramão da idéia de proteção ao trabalhador!


Prorrogação da jornada atrapalha conclusão de estudos e não gera indenização.

 Causa tristeza a notícia desta decisão. No caso julgado, a Justiça do Trabalho negou ao trabalhador o pagamento de uma indenização por dano moral, apesar de o mesmo ter seus estudos prejudicados em razão do excesso de horas extras! Claro que no caso em discussão os julgadores se apegaram a falta de argumentos que confortariam o deferimento da ação, mas o caso é preocupante.
 Muito se fala em mão-de-obra desqualificada no Brasil, mas casos como estes refletem expressamente o problema nacional. A aceleração do crescimento econômico tem suas consequências, a falta de qualificação é causada justamente pela falta de tempo para estudar e se há tempo o mesmo é usado para repouso ou recuperação para mais um dia de longa jornada. 
  Afinal o que importa é o capital!

(Seg, 01 Out 2012, 9:25)

 Comerciário que não pôde concluir o ensino médio em virtude das constantes faltas à escola causadas pela prorrogação da jornada de trabalho pleiteou, mas não conseguiu, o reconhecimento pela Justiça do Trabalho da ocorrência de danos morais. Logo na primeira instância, a 27ª Vara do Trabalho de Belo Horizonte (MG) indeferiu o pedido de indenização. Ele recorreu da sentença, sem sucesso, e o caso acabou
chegando à Terceira Turma do Tribunal Superior do Trabalho, que não conheceu do recurso de revista do trabalhador.

 Para basear seu pedido, o comerciário argumentou que havia normas coletivas da categoria proibindo prorrogação da jornada do comerciário estudante durante o período letivo. E que, pelos danos causados à sua formação educacional, o constrangimento em relação a seus familiares e a frustração da expectativa de conclusão do curso com seus amigos de classe, ele deveria receber uma indenização da sua empregadora, a J & N Modas e Acessórios Ltda.

 Porém, as alegações não foram suficientes para que o pedido fosse deferido pela Justiça do Trabalho. De acordo com o relator do recurso no TST, ministro Mauricio Godinho Delgado, "o desrespeito a cláusula de convenção coletiva, por si só, não gera o direito ao pagamento de danos morais".

 Ele ressaltou que há requisitos essenciais para a responsabilização empresarial e que, sem a conjugação desses requisitos, não se pode falar em responsabilidade do empregador. Que são: nexo causal - que associa a causalidade entre a conduta do empregador ou de seus prepostos; dano sofrido pelo empregado; e, regra geral, a culpa do empregador.

 Nesse sentido, o ministro Godinho Delgado destacou que o Tribunal Regional do Trabalho da 3ª Região (MG) concluiu, pela análise do contexto das provas existentes nos autos, "que não foram comprovados os requisitos necessários para a condenação da empresa ao pagamento da indenização por dano moral".

 Para o TRT-MG, faltaram documentos indispensáveis à propositura da ação, porque não houve prova documental dos fatos que teriam gerado o dever de reparar e não foi comprovada a alegação de que a instituição de ensino recusou-se a fornecer esses documentos. Além disso, ressaltou que o empregado não se insurgiu contra a prorrogação de jornada nas vezes em que lhe foi feita a exigência.
(Lourdes Tavares/RA)

Processo: RR - 123500-29.2007.5.03.0106


quarta-feira, 27 de junho de 2012

Horas Extras em Trabalho Externo

Excelente artigo do Juiz do Trabalho da 4ª Região Artigo por Carlos Alberto May.


Segundo o art. 62, inciso I, da CLT, “os empregados que exercem atividade externa incompatível com a fixação de horário de trabalho” não são abrangidos pelo regime da CLT, que estabelece regras acerca da duração da jornada de trabalho. Portanto, tais trabalhadores não estão sujeitos ao controle de horário e tampouco ao limite legal de oito horas diárias de trabalho. Ainda em consequência da norma citada, esses não fazem jus ao pagamento de horas extras, seja porque não abrangidos pelas regras de duração do trabalho da CLT, seja porque sua atividade não permite ao empregador saber se efetivamente estão ou não trabalhando. Trata-se, assim, de uma situação atípica, realmente extraordinária, visto que, na generalidade dos casos, os trabalhadores estão submetidos à fiscalização de seus horários de trabalho pelo empregador. Ou seja, somente estão abrangidos pela regra do art. 62, inciso I, da CLT, os empregados que exercem uma atividade externa – fora das dependências da empresa – que torne impossível ao empregador o controle dos horários em que iniciam ou terminam sua jornada, bem como dos intervalos. De uma forma bem simplista, pode-se dizer que estão nesta situação apenas aqueles empregados que executam uma atividade fora das dependências da empresa, de forma que o empregador não possa saber em que horários estão ou não trabalhando. Na Justiça do Trabalho, a maior parte dos litígios envolvendo pedidos de horas extras em contraposição à alegação de trabalho externo dizem respeito a motoristas de caminhões, vendedores externos, propagandistas de laboratórios farmacêuticos e promotores de vendas (que atuam em supermercados, expondo produtos diversos). A grande questão que se impõe é: a tecnologia atual – que disponibiliza telefones celulares, rastreamento por satélite, notebooks, palmtops, pagers, dentre outros equipamentos que permitem o acompanhamento direto e imediato do trabalho – afasta a incidência da regra do art. 62, inc. I, da CLT? A resposta é positiva. Ou seja, a tecnologia atual permite aos empregadores controlarem, com precisão, os horários em que seus empregados iniciam e terminam a jornada, as horas em que estão ou não trabalhando, de forma que, mesmo executando tarefas externamente, estão sujeitos ao controle de horário e têm direito, sim, a receberem horas extras. Hoje em dia, grandes transportadoras instalam em seus caminhões rastreadores por satélite, de forma a saber se o motorista faz uma parada em horário ou local não programado. Os vendedores externos e propagandistas de laboratórios transmitem seus pedidos de produtos em tempo real, através de notebooks, palmtops ou telefone celular. Já os promotores de vendas são controlados pelos próprios supermercados e lojas em que atuam, assim como igualmente mantêm contato com suas chefias por telefone celular. Como dizer, assim, que tais trabalhadores não podem ter seus horários de trabalho controlados? A solução é simples: a norma do art. 62, inciso I, é aplicável ao trabalhador que executa atividade externa que não pode ser controlada, e não àquela situação que podemos chamar de “omissão conveniente”, em que a ausência de controle de horário não decorre de impossibilidade, mas sim de conveniência do empregador, que se vê desonerado, assim, do pagamento de eventuais horas extraordinárias.

OBS: As opiniões expressas nos artigos publicados neste espaço pertencem exclusivamente aos autores dos textos, não representando o posicionamento do Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região em relação ao conteúdo abordado.

quinta-feira, 26 de abril de 2012

Lamentável termos que lembrar dos nossos trabalhadores desta forma!

Homenagem da Justiça do Trabalho aos 2.796 mortos em acidentes de trabalho em 2011, por ocasião do dia 28 de abril de 2012, data mundial de homenagem às vítimas de acidentes de trabalho: http://www.tst.jus.br/web/trabalhoseguro/inicio/-/asset_publisher/9zRx/content/homenagem-da-justica-do-trabalho-aos-2-796-mortos-em-acidentes-de-trabalho-em-2011

quarta-feira, 29 de fevereiro de 2012

Trabalhadores de estádios da copa pedem piso nacional

 


Postado por Relações do Trabalho em 28 fevereiro 2012 às 19:30
Publicado em 28/02/2012 no Valor Econômico. Por André Borges

Enquanto se discute, aqui no RS, quem vai financiar a obra do Estádio Beira-rio, os sindicatos já falam em greve geral dos funcionários que estão trabalhando nos estádios da copa, caso não seja aprovada a estipulação de um piso nacional para essa categoria! Vejamos a notícia abaixo:
   Os sindicatos que representam os trabalhadores da construção civil em todo o país vão pedir apoio ao governo para que o setor adote um piso salarial nacional. Uma reunião entre dirigentes sindicais e representantes da União está marcada para o dia 6 de março, em Brasília. No encontro será apresentada a proposta salarial que irá para a mesa de negociação com as empreiteiras.
   O pedido para igualar os salários dos trabalhadores não atinge todo tipo de obra. No alvo dos sindicatos estão as construções e reformas dos 12 estádios para a Copa do Mundo de 2014. O argumento dos sindicalistas é que essas obras têm características de engenharia parecidas, estão concentradas nas mãos de poucas empreiteiras e contam com os mesmos fornecedores de materiais. São as mesmas tarefas. Não há por que o salário desse trabalhador ser tão diferente entre um Estado e outro, diz Claudio da Silva Gomes, presidente da Confederação Nacional dos Trabalhadores nas Indústrias da Construção e da Madeira (Conticom/CUT).
   A negociação do piso nacional para as obras dos estádios é um dos temas mais sensíveis na pauta sindical, tanto que o assunto foi excluído do pacto da construção civil que será assinado na quinta-feira pela presidente Dilma Rousseff.
   Por trás da negociação dos salários está a ameaça de uma paralisação nacional dos trabalhadores, caso as negociações não avancem. Hoje 25 mil trabalhadores estão à frente das obras dos estádios da Copa. Os sindicalistas querem piso nacional unificado de R$ 1,1 mil para a função de ajudante de obras, profissional que hoje ganha cerca de R$ 600 na região Nordeste. A reivindicação para carpinteiros e pedreiros é de R$ 1.580, contra a média atual de R$ 1,2 mil. A cesta básica requerida é de R$ 350, enquanto o valor atual transita entre R$ 250 e R$ 300. Os trabalhadores também querem folga de cinco dias úteis consecutivos a cada 60 dias trabalhados para visitar familiares, com custo de transporte bancado pelas empresas.
   A possibilidade de paralisação nacional existe. Há uma grande expectativa dos trabalhadores de todo o país sobre esse tema, diz Nair Goulart, presidente-adjunta da Confederação Sindical Internacional (CSI). Foram feitas assembleias em todos os Estados onde há estádios em construção. Todo trabalhador está atento e acompanhando isso de perto.
   Procurada pelo Valor, a Câmara Brasileira da Indústria da Construção (Cbic), que representa as empreiteiras, informou apenas que tem acompanhado as discussões.
   Nesta quinta-feira, o governo finalmente sela o pacto da construção civil. O termo de compromisso, voltado para a melhoria das condições de trabalho nos canteiros das grandes obras de infraestrutura do país, é resultado dos atos de vandalismo que paralisaram a construção da hidrelétrica de Jirau, em Porto Velho (RO), um ano atrás.
   A mão de obra dos trabalhadores da construção sempre foi tratada de forma muito displicente, mas essa situação mudou. Hoje a balança está pendendo mais do lado dos trabalhadores do que dos empresários, diz Ricardo Patah, presidente nacional da União Geral dos Trabalhadores.
   Os sindicatos comemoram a assinatura do pacto com o governo, mas a realidade é que o documento se limita a um termo de compromisso. Sabemos que, judicialmente, nenhuma empresa terá obrigação de cumprir o que diz o pacto, mas vamos usar essa peça para cobrar melhores condições das empreiteiras, diz Claudio da Silva Gomes, da CUT.

   O acordo prevê que 100% do processo de recrutamento e seleção dos trabalhadores seja feito por meio do Sistema Nacional de Emprego (Sine), eliminando a figura do gato, que intermediava as relações de trabalho. Os trabalhadores também terão representantes internos, além dos sindicatos. Será eleito um representante para cada 500 trabalhadores, até o limite de sete representantes, os quais ficarão em contato frequente com os sindicatos e construtoras. O pacto também garante condições básicas de segurança no trabalho, saúde e alimentação.

terça-feira, 17 de janeiro de 2012

"Invalidez por acidente de trânsito dispara"

Publicado em 17/01/2012 na Folha de S. Paulo. Por Érica Fraga.

Maior parte dos casos é de jovens em idade economicamente produtiva; gasto previdenciário chega a R$ 8,6 bi

Casos de invalidez permanente de vítimas do trânsito se multiplicaram por quase 5 de 2005 a 2010



"Sempre fui dinâmica, independente. Agora, não consigo trabalhar."

Desde que sofreu um acidente com moto, há um ano, Carlita Tarsiana Carvalho, 28, está afastada pelo INSS. Ela torce para recuperar os movimentos do braço esquerdo, hoje totalmente paralisado.

"Já passei por cirurgia, mas não obtive resultado algum", diz ela, que trabalhava em um supermercado, repondo mercadorias nas prateleiras.

A história de Carlita representa uma situação cada vez mais comum. Casos de invalidez permanente entre vítimas de acidentes de trânsito se multiplicaram por quase cinco entre 2005 e 2010, passando de 31 mil para 152 mil por ano.

Nos primeiros nove meses de 2011, houve novo aumento de 52%, para 166 mil, segundo números do Dpvat, seguro obrigatório pago por proprietários de automóveis.

Os dados revelam que a maioria dos acidentados - mais de 70% dos casos em 2011 - usava moto e está em plena idade economicamente ativa (entre 18 e 44 anos).

O quadro preocupa a Previdência Social, que teme ter de arcar com os custos de uma geração de jovens aposentados por invalidez.

"O que mais tem crescido é a concessão de aposentadoria por invalidez devido a acidentes com motos", diz Leonardo Rolim, secretário de Políticas de Previdência.

"Há trabalhadores que só contribuíram [à Previdência] por cinco anos, mas que vão receber aposentadoria por invalidez pelo resto da vida."

Projeções apontam que o INSS gastou R$ 8,6 bilhões com benefícios gerados por acidentes de trânsito. A cifra representa 3,1% de todas as despesas previdenciárias.

PREJUÍZO ECONÔMICO



O Dpvat classifica os casos de invalidez como leves, moderados e graves.

O INSS considera que há situações em que, depois de um período de tratamento, o beneficiário pode voltar a trabalhar, ainda que em outra função. Mas, segundo especialistas, crescem os casos em que o trabalhador acaba tendo de se aposentar.

Antônio Carlos de Souza, 49, acha que dificilmente voltará a ser motorista: "Não consigo subir escada ou dirigir, e já estou afastado há mais de três anos".

Souza dirigia o carro da empresa onde trabalha numa tarde de dezembro de 2008 quando uma Kombi o atingiu. Após o acidente em estrada entre Jundiaí e Campinas (SP), ficou com uma perna mais curta do que a outra.

Segundo Ricardo Xavier, diretor-presidente da Seguradora Líder, que administra o Dpvat, o forte aumento da frota de carros e principalmente de motos nos últimos anos explica a explosão dos casos de invalidez.

"Qualquer acidente de moto pode gerar invalidez porque o motorista é mais vulnerável", afirma Xavier.

De 2001 a 2011, as vendas de motos quase triplicaram, chegando a 1,94 milhão no ano passado. Em 2011, as vendas de carros atingiram 2,65 milhões de unidades, pouco mais que o dobro das de 2001.

O engenheiro e sociólogo Eduardo Vasconcellos diz que a explosão dos casos de invalidez gerados por acidentes com moto representa um prejuízo para os acidentados e para a economia do país.

Ele diz que o cenário de acidentes com motos tende a piorar ainda mais nos próximos anos. "Existe um grande desafio que é o que fazer com as motocicletas."

A preocupação com o problema levou a Previdência a reivindicar participação no Contran (Conselho Nacional de Trânsito) para participar da discussão e da elaboração das políticas de trânsito.

terça-feira, 3 de janeiro de 2012

País gasta muito com seguro-desemprego

Publicada em 3 de Janeiro de 2012 pelo O Estado de São Paulo. Por José Pastore.

O Brasil é o único país no mundo em que o emprego cresce e as despesas com seguro desemprego disparam. O paradoxo decorre de instituições de má qualidade no campo do trabalho.

Explico-me.

Para fazer jus ao seguro-desemprego, o empregado precisa ter trabalhado pelo menos seis meses com registro em carteira. Para poder sacar os recursos depositados no FGTS, o empregado necessita completar um ano de serviço, desde que dispensados em justa causa.

Vejamos o que ocorre com um empregado que ganha R$ 1mil por mês e que completa um ano na mesma empresa.

As estimativas a seguir são feitas com aproximações e sem considerar os descontos de lei.

Se ele for dispensado sem justa causa, terá acumulado R$1.040 na sua conta do FGTS (inclusive a parcela do 13.º salário). No caso de ser desligado da empresas em justa causa, sacará esse montante e receberá R$ 400 a título de indenização de dispensa, perfazendo R$ 1.440. Além do salário do mês, como parte das verbas rescisórias, ele terá direito a R$ 1 mil de 13.º salário e R$1.333 a título de férias e abono,o que no agregado soma R$ 3.773.Uma vez despedido,ele receberá quatro parcelas no valor de R$ 763,29 a título de seguro-desemprego, ou seja, R$ 3.053,16. Em resumo: para viver nestes quatro meses, o empregado em tela disporá de R$ 6.826, o que dá uma média mensal de R$1.706, ou seja, 70% a mais do que ganhava quando estava trabalhando.

Até aqui foi tudo legal. Mas, com a atual falta de mão de obra, o referido trabalhador pode ser e empregar com facilidade.

Para não perder o benefício do seguro-desemprego, muitos procuram um emprego informal. Digamos que o protagonista do exemplo consiga ganhar R$ 1mil nessa atividade, ou seja, R$ 4 mil durante os quatro meses. O ganho total no período subirá para R$ 10.826, que dá uma média de R$2.706 mensais! Além disso, há o abono salarial.

Numa realidade desse tipo, não é à toa que tanta gente utilize esses expedientes.

Isso ocorre principalmente entre os empregados de baixa renda. Os dados mostram que, em 2010, 85% dos saques do FGTS foram feitos em contas cujo saldo médio era de apenas R$ 1mil (tendo totalizado R$ 12 bilhões). Para quem ganha R$ 1mil por mês,um acréscimo de renda de 170% é de extrema valia.

É assim que se explica por que os pedidos de seguro-desemprego aumentam numa hora em que (ainda) são abundantes as oportunidades de emprego. As despesas explodem. O pagamento do seguro-desemprego e do abono salarial consumiu em 2011 cerca de R$ 32 bilhões - quase 20% acima do que se gastou em 2010.

Uma parte do estouro das despesas foi devida à elevação do salário mínimo em 2011. E o que ocorrerá em 2012? O salário mínimo será de R$ 622 mensais - um aumento de 14% em relação a 2010. O governo que se prepare.As despesas com seguro- desemprego e abono salarial explodirão.

Mas essa é só uma parte da história. A outra, de maior impacto, vem da combinação das estratégias acima descritas e ganha força num mercado de trabalho aquecido. A rotatividade aumenta porque muitos empregados "provocam" sua demissão (sem justa causa) e entram na ciranda das benesses.

Esse é um bom exemplo de como más instituições induzem a perigosas distorções. Está na hora de fazer uma boa revisão das leis que dão suporte a essas manobras. A exigência de aceitar um emprego oferecido pelo Ministério do Trabalho (criada em setembro de 2010) é uma boa medida, mas ainda é tímida. Uma reforma de profundidade exige a combinação do seguro-desemprego e do FGTS com programas de treinamento e com a própria aposentadoria.

Mas esse é um assunto complexo que fica para outra oportunidade. Ademais, os recursos do FGTS pertencem aos trabalhadores, que já vêm sendo expropriados por uma taxa de juros ridícula, e a eles cabe a primeira palavra.

✽ PROFESSOR DA FEA-USP, MEMBRO DA ACADEMIA PAULISTA DE LETRAS, É PRESIDENTE DO CONSELHO DE EMPREGO E RELAÇÕES DO TRABALHO DA FECOMÉRCIO DE SÃO PAULO. SITE: WWW.JOSEPASTORE.COM.BR

domingo, 11 de setembro de 2011

O que o aumento das taxas de juros tem a ver com o trabalhador?

Sempre que o CoPoM (Comitê de Política Monetária) se reune para definir as diretrizes da política monetária nacional e o percentual das taxas de juros, é motivo de críticas ou elogios de vários setores, quando aumenta a taxa, as entidades empresariais criticam, porém os bancos e o governo aprovam, quando a taxa é mantida ou reduzida para estimular o consumo, o comércio comemora.
      Ocorre que na maioria das vezes, como o Brasil e a maioria dos Países em desenvolvimento optaram pelo regime capitalista, a única, ou mais viável, maneira de controlar a tão temida inflação é por meio de controle do valor da moeda nacional.
O Copom  se reúne a cada 45 dias para definir se a referida taxa de juros irá aumentar, diminuir ou permanecer a mesma, e em caso de alteração, em qual percentual será modificado.
Aumentar a taxa de juros significa tornar o dinheiro “mais caro” valorizar a moeda! Porém poderá “frear” o consumo. Esta medida é usada geralmente para conter a inflação.

Mas e o trabalhador o que tem a ver com isso?
Muitas são as influências no mercado de trabalho, talvez essa influência não se sinta tão imediatamente como ocorre em relação às instituições financeiras, que em sua maioria trabalham com “venda de dinheiro”. O aumento da taxa de juros sempre vem acompanhado, como já dito, de diminuição do consumo, por diminuir o crédito direto ao consumidor e assim “esfriar” a industria e o comércio, que vivem da venda de produtos.
Com as vendas diminuindo, as empresas visando não assimilar prejuízos pensam logo no corte com a folha de pagamento, ou seja, demissões em massa. O desemprego na indústria preciona o governo e o CoPoM a baixar as taxas de juros para “aquecer” a indústria e o comércio fazendo com que as empresas contratem novamente.
No atual governo a política que se segue é técnica, não havendo razões políticas influentes, porém na última reunião muito se falou em jogada política na redução da taxa.
Assim, preste atenção nas políticas do governo e nas decisões do CoPoM sobre as taxas de juros, elas são muito importantes para todo o povo!

segunda-feira, 18 de julho de 2011

A proporcionalidade do aviso-prévio (continuação), por Rubens Fernando Clamer dos Santos Júnior, Juiz do Trabalho.



Rubens Fernando Clamer dos Santos Júnior 
Juiz do Trabalho

Este texto é continuação do artigo publicado no dia 11 de julho , sobre o mesmo tema.
No julgamento de um mandado de injunção o Supremo Tribunal Federal recentemente sinalizou pela aplicabilidade do aviso-prévio proporcional ao tempo de serviço, estando suspenso o julgamento para definição da proporcionalidade que será utilizada. É justamente sobre esta proporcionalidade que pretendo expor algumas idéias, com base no artigo  da Lei de Introdução ao Código Civil, no art. 126 do CPC e no da CLT
Por óbvio, a norma constitucional que assegura este direito tem como finalidade estabelecer relação direta com o tempo de serviço do trabalhador. Quanto maior o tempo de serviço, maior a proporcionalidade a ser observada, sendo este o princípio da norma a ser seguido. Esse princípio também está assegurado nas normas que asseguram o direito às férias, ao 13º salário, à indenização por tempo de serviço prevista no artigo 478 da CLT, e ao regime do FGTS. 
Em relação às férias e ao 13º salário, o parâmetro observado é o recebimento integral dessas verbas, como regra geral, a cada ano de serviço prestado, correspondente a um mês de remuneração do trabalhador. Da mesma forma, a proporção fixada no artigo 478 daCLT corresponde a um mês de remuneração por ano de serviço prestado. Trata-se de um valor estabelecido, refletido na norma, que visa prestigiar o tempo de serviço do trabalhador, encontrando-se também este valor na norma que assegura o aviso-prévio proporcional ao tempo de serviço, ao fixar um mínimo de trinta dias. 
Portanto, as normas que asseguram os referidos direitos servem de parâmetro para fixação da proporcionalidade do aviso-prévio, não se podendo falar na inexistência de regras para o exercício da analogia, com vistas ao preenchimento da lacuna da lei constitucional. Podemos utilizar o mesmo valor para fixação desse direito (tempo de serviço) e fixar, igualmente, o mesmo critério para estabelecimento da proporcionalidade (um mês de remuneração por ano de serviço). Assim como essas normas fixam uma regra para preenchimento da lacuna, estabelecem também um limite para fixação dessa proporcionalidade, pois inexistem parâmetros superiores a serem observados pelo uso da analogia. 
Poderá, ainda, ser utilizado o critério estabelecido no ex-precedente normativo nº 13 do TRT gaúcho, estabelecendo-se a proporcionalidade a razão de cinco dias por ano ou fração igual ou superior a seis meses de tempo de serviço, observado o limite de sessenta dias. Desse modo, a proporcionalidade é estabelecida com base em uma construção doutrinária e jurisprudencial que acarretou a criação do referido precedente normativo. Apesar de cancelado, o citado precedente não deixou de ser uma fonte heterônoma do Direito do Trabalho, que pode ser usado, sobretudo, porque estabelece uma proporcionalidade mínima e razoável. 
Nesse contexto, valendo-se de qualquer um dos dois critérios expostos acima teremos condições de fixar a proporcionalidade com a observância de parâmetros legais, com vistas à concretização de um direito fundamental conferido pela Constituição brasileira aos trabalhadores.

OBS: As opiniões expressas nos artigos publicados neste espaço pertencem exclusivamente aos autores dos textos, não representando o posicionamento do Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região em relação ao conteúdo abordado


Fonte: http://www.jusbrasil.com.br/noticias/2777530/artigo-a-proporcionalidade-do-aviso-previo-continuacao-por-rubens-fernando-clamer-dos-santos-junior-juiz-do-trabalho